Luís
XIV governou a França durante um de seus períodos de maior prosperidade. Entre
1643 e 1715, ele estendeu as fronteiras e contribuiu para o fortalecimento do
país como potência política e econômica. Também patrocinou o trabalho de
escritores como Voltaire e do dramaturgo Molière, próceres do iluminismo,
movimento que arejou o pensamento ocidental. Outra contribuição importante do
monarca à posteridade não costuma figurar nos livros de história: Luís XIV
inventou o luxo tal como o conhecemos hoje. Os diamantes e o champanhe, por
exemplo, tornaram-se sinônimo de sofisticação e glamour em seu reinado. Os
sapatos de salto alto, indispensáveis para as mulheres elegantes, foram ideia
dos artesãos palacianos. A gastronomia francesa, com seus chefs, e a
alta-costura, com seus estilistas-estrelas, apareceram durante seu reinado,
assim como as butiques, as grifes e os salões de cabeleireiros.
Desde
o antigo Egito, todas as monarquias se cercam de luxos e riquezas. A diferença,
no caso de Luís XIV, é que o estilo de sua corte se perpetuou. A explicação
para isso é que, sob o cetro de Luís XIV, o luxo deixou de ser exclusividade
dos nobres para se transformar em objeto de consumo. A Europa ficou fascinada
pelas criações da corte francesa. Todos queriam roupas, móveis e receitas
culinárias vindas da França – há até um estilo de móveis e pinturas chamado
Luís XIV. Já naquela época os franceses souberam se aproveitar desse sucesso e
transformaram a moda, os perfumes e a gastronomia em indústrias que desde então
só fizeram crescer e, hoje, são alicerces da economia do país.
Esse
legado do Rei Sol, como era conhecido em seu tempo, está descrito no
recém-lançado The Essence of Style (A Essência do Estilo), da americana
Joan DeJean, especialista em cultura francesa, da Universidade da Pensilvânia.
"Luís XIV era obcecado pela ideia de que ostentar o luxo era uma forma de
demonstrar poder", disse DeJean a VEJA. Segundo a pesquisadora, o apreço
do rei pelo luxo não era apenas uma questão de vaidade, mas parte da estratégia
de promoção da França. Paris deveria ser admirada por um esplendor que deixava
na sombra seus principais rivais, Londres e Amsterdã. Para tornar mais
eficiente essa, digamos, ação de marketing, o rei contava com a valiosa
colaboração de seu ministro das Finanças, Jean-Baptiste Colbert. Foi dele a
idéia de lançar o primeiro jornal de moda, o Mercure Galant, para fazer
com que as roupas parisienses ficassem conhecidas e fossem cobiçadas em toda a
Europa. Foi nas páginas do jornal, a partir de 1670, que Colbert difundiu uma
de suas idéias mais célebres: a de que as coleções deveriam mudar a cada
estação do ano – conceito que ainda é lei no mundo da moda.
Luís
XIV cuidava para que sua imagem pessoal refletisse poder em todos os detalhes.
Esmerou-se na construção de palácios suntuosos, como o de Versailles. Um dos
aposentos mais famosos do palácio, a sala dos espelhos, saiu de sua imaginação.
Há 300 anos, o espelho era uma preciosidade. Alguns poucos exemplares eram
feitos por vidraceiros de Veneza, mas eram pequenos, irregulares e muito caros.
Em 1660, Luís XIV levou a tecnologia dos espelhos para a França e mandou que se
produzissem peças em tamanho grande, capazes de cobrir paredes inteiras,
próprias para "enobrecer um ambiente e multiplicar o brilho das
superfícies, fazer tudo parecer maior do que a vida". Durante seu reinado,
inventaram-se também quase todos os tipos de sapato usados hoje, incluindo as
sandálias de salto alto, na época adotado por homens e mulheres – e,
evidentemente, pelo rei. Até a gastronomia como é conhecida atualmente teve
origem na época do Rei Sol. Ele considerava essencial dar estilo próprio à
culinária francesa. As sobremesas surgiram desse empenho pela diferenciação.
Até o fim do século XVII, os doces eram servidos com os alimentos salgados nas
refeições.
Tudo
o que o rei usava imediatamente se tornava moda. Foi o que ocorreu com os
diamantes. Durante toda a Renascença, a pérola era considerada a mais nobre das
jóias. Um dia, um joalheiro mostrou ao monarca um diamante que havia trazido da
Índia, e ele se apaixonou pela pedra. Em 1669, gastou o equivalente a 75
milhões de dólares para comprar todos os diamantes disponíveis e os tornou
objetos desejados na Europa inteira. A paixão de Luís XIV pela sofisticação não
apenas mudou hábitos e costumes como alterou o funcionamento das cidades. Foi
dele a idéia de iluminar as ruas de Paris à noite. A vida parisiense também se
transformou entre 1670 e 1680 com a inauguração das primeiras butiques. Antes,
só se compravam roupas em armazéns ou por encomenda a costureiras. Com seu
empenho em promover Paris como a metrópole da elegância, Luís XIV
profissionalizou o luxo e o projetou para a história.
Fonte: Revista Veja - Edição 1920
de 31 de agosto de 2005 –
http://veja.abril.com.br/310805/p_110.html
http://veja.abril.com.br/310805/p_110.html
Reportagem de Gabriela
Carelli
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